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terça-feira, 11 de outubro de 2005

Sob o fogo das armas - minha opinião

Esse post é grande. Mas fazer o quê? O assunto é importante.

Quanto ao referendo popular sobre a proibição do comércio de armas no Brasil, quero deixar claro que jamais serei a favor.

A favor de quem é contra, eu tô falando.

Então vou dar minha opinião e, no final, contar uma historinha que vou inventar daqui até lá. Espero que agrade. Antes, porém, um pequeno poema feito agora.

ENCONTRO NÃO MARCADO

Kali (em homenagem a todos os que votam SIM no referendo das armas).

Um homem passeava.
E na esquina de uma avenida
Encontrou perdida uma bala
E lhe perguntou, assim, espontâneo
(Seu nome era Afrânio):
- De onde você vem?

A bala então respondeu,
Assim, desinibida:
- Não sei de onde eu venho
  Mas sei para onde vou.

E num movimento instantâneo
Atravessou-lhe o crânio.


E agora, senhoras e senhores, as armas da minha opinião contra a opinião das armas. A análise é genérica. Em assim sendo, nada de pessoal contra os contra. Podem desarmar os espíritos, portanto, brava gente.

Então. Penso eu que por trás da idéia de uma pessoa se arvorar no direito de ter uma arma para se defender da violência reside o espírito individualista típico da nossa época capitalista. Um espírito egocêntrista incapaz de vislumbrar uma saída coletiva, social e eficaz contra a violência. Pensamento de um ser egoísta e autosuficiente o bastante para ser capaz de comprar uma arma com o suor de rosto reivindicando a capacidade de poder com ela também defender seu sangue, seus bens em meio a uma sociedade completamente sem rumo, de balas e esperanças perdidas. Não é à toa que o herói de nosso tempo seja o super-homem.

O individualismo a que cada cidadão foi jogado pela sociedade capitalista leva-o a acreditar que possui superpoderes, seja pela alucinação da miséria a que é submetido, seja pela autosuficência opulenta em que está metido.

Essa forma egocêntrica e limitada de olhar o mundo através das lentes míopes e embaçadas do individualismo é que faz o cidação da classe média querer a posse de uma arma e acreditar sinceramente que ela irá ajudá-lo a proteger a si, sua família e seu patrimônio da violência cotidiana que assola o país e que, há muito tempo, vem batendo à sua porta sem tocar a campainha. É o sagrado direito de defesa da vida e dos bens, como diz a propaganda dos "contra".

Tendo como farol de orientação o próprio umbigo, procura com os próprios meios conduzir com segurança seus bens materiais e humanos mais valiosos num frágil barco em meio à borrasca social, sem esboçar nenhum interesse em descobrir as origens e causas das ondas de vilência de que é vítima. Pior: muito menos procura lutar ou contribuir coletivamente para a solução do problema. Já não acredita na polícia. Menos por ela estar totalmente corrompida do que pelo desejo de ele mesmo contratar a sua própria segurança e que se lasque o resto.

Armar-se contra a violência pode significar uma atitude bastante nobre e louvável do ponto de vista individual, mas socialmente pode representar o aumento do desastre. "Mas, kali, a proibição do comércio de armas vai desarmar o honesto e armar o bandido, já que este não se utiliza do comércio legal para se armar!".

Por isso mesmo. O fim da comercialização de armas no país pode produzir dois importantes benefícios, além de outros. Primeiro, reduzir o fluxo de armas para os delinqüentes, pois boa parte dese arsenal vem do roubo das armas das pessoas comuns e não do comércio ilegal; segundo, ajuda a canalizar o confronto armado para onde deve ser transferido: para a arena de luta entre a polícia e a bandidagem, e você fora da linha de tiro (a não ser que queira ser um policial, evidentemente - ou um bandido, claro).

Há muitos outros argumentos. O simples fato de haver uma arma de fogo dentro de casa pode levar a uma cena trágica. Se você pensar que a maior parte das ações de homicídio são de origem patrimonial e que, exemplo, numa briga conjugal, essa questão está freqüentemente colocada (na separação, sempre) não é difícil imaginar o que pode acontecer quando um dos cônjuges encontra uma arma a seu alcance, no calor da situação. Nem precisa: os jornais trazem esses desfechos quase diariamente.

Outra coisa: quem garante que só os filhos dos outros é que descambam para a delinqüência? Dias desses um rapaz idiota da classe média do RJ praticou uma assalto a mão armada contra um taxista, ajudado por colegas. Onde ele conseguiu a arma? Teve que subir o morro para comprar uma? Não, só precisou de uma cadeira para pegá-la em cima do armário.

Mais uma, não menos importante: a liberação do comércio deveria então ser democrática, pois, só os mais ricos vão poder comprar armas. E os pobres? Eles teriam ainda mais direito, pois nos bairros pobres a polícia só aparece para reprimir e matar (nem sempre os bandidos, mas pessoas humildes e trabalhadoras). Policiamento que é bom, só nos bairros ricos. Então tinha que ter um Bolsa-pistola, alguma coisa assim, sei lá.

Outra: no mundo informatizado de hoje, há que se discutir a eficácia das armas de fogo diante dos aparelhos eletrônicos e dos modernos recursos de segurança. Um simples telefone celular, por exemplo, numa necessidade de socorro. Câmaras, sistemas de alarmes, gps, imobilizadores com descarga elétrica, sistema de identificação individual etc. A arma se torna cada dia mais obsoleta e muito mais perigosa diante de tantos recursos.

Mais uma: a visão egocentrista e antisocial que leva uma pessoa a apostar no uso da arma de fogo como autodefesa não a permite enxergar que os bandidos não dão em árvores, mas têm seus vínculos pessoais, como comparsas, irmãos, filhos.. e nem toda falta de razão impedirá de algum deles pleitear vingança contra a morte de um fascínora querido (ou o próprio fascínora, se ele conseguir escapar com vida de uma reação armada). E aí? Que tal ser um cabra marcado para morrer, mesmo com a posse de uma arma?

Interpreto a disposição das pessoas se armarem para se defenderem da violência da seguinte forma: essa atitude representa a desistência da luta por uma sociedade harmônica, a aceitação da violência como um fato consumado, por mais contraditório que possa parecer essa conclusão. Na minha opinião, os favoráveis à comercialização das armas estão implicitamente desistindo de procurar as origens dessa violência preferindo entrar numa dança esquisita de ritmo ditado por som de tiros. Entrando no meio do tiroteio, se preferirem. Querem armas. Porém, emprego, que é bom... É o emprego das armas em lugar da arma do emprego. Isso.

Bem, agora um historinha tudo a ver com o assunto.

AS ARMAS E OS ANTROPÓGAFOS PAPA-BRANCAS

Há muito tempo atrás, muito além daquela serra que azula no horizonte, onde vivia Iracema, a virgem dos lábios de mel, instalou-se uma colônia de cara-pálidas provenientes do Velho Mundo. Não muito longe dali, no meio das florestas infindáveis daquele país, existia uma ladeia de índios antropófagos, os Papa-brancas que, vez ou outra, faziam incursões no povoado dos cara-pálidas para comer mulher branca. No bom sentido do verbo devorar, não por causa da beleza daquelas mulheres, mas por causa da maciez de suas vísceras. Os índios Papa-brancas achavam as índias cara-pálidas realmente muito gostosas, literalmente.

Os brancos, não suportanto mais a perdas de suas mulheres, se reuniram para pôr fim àquela selvageria.

Decidiram que todo habitante daquela vila, fosse homem ou mulher, criança ou adulto, poderia dispor de uma arma de fogo a partir daquela data, como forma de defesa contra a devora de suas mulheres pelos índios Papa-brancas. A decisão foi tomada num referendo popular onde a consulta apresentada foi a seguinte: "Você é contra ou a favor de não poder dar um tiro num índígena que tentar comer sua esposa, sua irmã, sua cunhada, sua filha ou qualquer outra mulher da nossa aldeia?"

Cem por cento dos habitantes com direito a voto votaram na primeira opção e todos passaram a andar armados.

Tudo ia bem, até que um dia um jovem do vilarejo estava cuidando sozinho de uma plantação de berinjelas quando um silvícola comedor de mullher branca surgiu bem diante dele. O agricultor pensou em sacar de sua arma sem saber que aquele índio na sua frente estava ali apenas para distraí-lo para que outro índio, por trás, pudesse lhe decepar a cabeça com uma borduna enquanto ele tentasse pegar a arma. Os índios então embrulharam-no com folhas de bananeira para comer em casa, digo, na taba, pois eles também comiam homens brancos, apesar de gostarem mais das mulheres brancas. E levaram também a arma que o pobre coitado não conseguiu usar.

Tal cena foi se repetindo ao longo do tempo, de modo que, no final de um ano a aldeia estava cheia de ossos amarelos de homens brancos e cheia também de armas carregadas.

Numa linda tarde de sol, Bunda-pelada, um índio jovem e muito inteligente, que havia estudado na Escola de Artilharia do Exército da Corte, parou no meio da aldeia e, vendo aquele monte de armas ao lado da taba principal, teve uma idéia. Foi então falar com o cacique da tribo.

- Grande Cacique, chefe dos índios Papa-brancas, ouça o que tenho a dizer.

- Bunda-pelada pode falar.

- Grande Cacique, para facilitar nossa caça de mulher branca, poderíamos usar as própria próprias armas dos cara-pálidas, aquelas que estão do tabo da lada, digo, do lado da taba, em vez do tacape e da borduna, pois elas são mais mortais. Com nossa mira de guerreiros de arco e flexa e com os ensinamentos do que aprendi na corte de homem branco, cada tiro há de ser um tombo.

O cacique deu-lhe um tapa nas ventas e lhe respondeu:

- Índio Bunda-pelada idiota! Querer botar azeitona na nossa empada!

Kali.
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Não falo de mim,
mas do mundo,
bem mais importante
e interessante.
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