Poemas kálidos:

A Lenda do Beijo
A Mulher que Namorou o Tempo
Aldeia Global
Evolução
Lábios Trêmulos
Poema do Ciúme
Poesia Concreta
Poema do Blogueiro
Cachorra
 

       
Contos kálidos:


A Repulsa
Duetos
Os Olhos do Velho
Tempestade de Neve



Águas passadas 

2002

jan fev mar abr
mai jun jul

ago

set

out

nov

dez

2003

janfev mar abr
mai jun jul ago
set out nov dez

2004

jan fev mar abr
mai jun jul ago
set out nov dez

2005

jan fev mar abr
mai jun jul ago
set out nov dez

2006

jan fev mar abr
mai jun jul ago

set

out

nov

dez

2007

jan fev mar abr
mai jun jul ago
set out nov dez

2008

jan

fev

mar abr
mai jun jul ago
set out nov dez

2009

jan

fev

mar abr
mai jun jul ago
set out nov dez

2010

jan

fev

mar abr
mai jun jul ago
set out nov dez

2011

jan

fev

mar abr
mai jun jul ago
set out nov dez

2012

fev

fev

mar abr
mai jun jul ago
set out nov dez

 



Blogs:

 
(Selo que concedo
aos blogs que admiro)

Recebi:

Visitantes:

Powered by Blogger

 

 

segunda-feira, 21 de julho de 2003

Final

Na manhã seguinte, levando outra mulher como companhia e, pretextando fazer um passeio, a senhora Giovanna caminhou até a modesta casinha de Federigo e perguntou por ele. Como o tempo não era adequado para caçar pássaros, Federigo trabalhava na sua horta e, ouvindo que Dona Giovanna o procurava à sua porta, ficou muito surpreso e acorreu cheio de alegria. Ela, ao vê-lo aproximar-se, foi ao seu encontro com aqueles dons femininos de agrado e, respondendo ao seu cumprimento reverente, falou:

-Esteja com Deus, Federigo. E acrescentou:

-Vim aqui recompensá-lo pelos dissabores que padeceu no passado por minha causa, quando seu amor o levou além dos limites da razão. E a recompensa é que ficarei aqui com esta senhora minha amiga para almoçarmos na intimidade com você.

Ao que Federigo humildemente respondeu:

- Senhora, nenhum dissabor me recordo que me houvesse causado, mas somente benesses, e se eu possa ter tido valor em alguma ocasião foi devido ao seu próprio valor e ao amor que lhe devotei. E seguramente esta sua visita de cortesia é mais bem-vinda para mim do que se todo o dinheiro que gastei voltasse à minha posse para poder gastá-lo de novo; mas a senhora veio a um pobre anfitrião.

Com estas palavras, a fez entrar, envergonhado, na sua casa e a conduziu depois ao seu jardim. Não tendo outra pessoa para fazer-lhe companhia, disse:

- Senhora, como não tenho mais ninguém, esta boa mulher, esposa deste trabalhador, lhe fará companhia enquanto eu me ponho a preparar a mesa.

Ainda que sua pobreza fosse extrema, só agora Federigo se dava verdadeiramente conta de como fora gastador e da falta que sua riqueza lhe fazia neste momento. Nada encontrando para oferecer à senhora, em cuja honra esbanjara uma fortuna, ficou angustiado, maldizendo a si mesmo e a sua sorte, correndo para lá e para cá. Sem ter nenhum dinheiro, nem qualquer bem que pudesse penhorar, e querendo tratá-la com tantas honrarias quanto pudesse, mas não desejando pedir nada a ninguém, nem ao seu trabalhador, acabou correndo os olhos por seu estimado falcão, empoleirado na saleta. Nada mais tendo a que apelar, pegou a ave e, achando-a bem gorda, julgou que daria um prato à altura de tão ilustre dama. Sem pensar duas vezes, torceu o pescoço do bicho e o deu a uma jovem criada para depenar, botar num espeto e assar cuidadosamente, enquanto ele colocava sobre a mesa uma toalha e guardanapos alvíssimos, que ainda lhe restavam, e com um sorriso radiante no rosto foi até o jardim comunicar que o modesto almoço que conseguira preparar-lhe estava pronto. Ela e sua amiga dirigiram-se à mesa e, sem saber o que degustavam na companhia de Federigo, que as servia atenciosamente, comeram o bom falcão. Deixando a mesa, depois de se demorar com ele em agradável conversação, sentiu chegada a hora de expor-lhe o que realmente a trouxera ali e, com a maior cortesia, começou a falar:

- Federigo, lembrando sua vida passada e a minha honestidade, que porventura você talvez considere nada mais do que dureza e crueldade, não tenho nenhuma dúvida de que vai ficar chocado com a minha presunção, quando souber por que motivo vim até aqui; mas se tivesse filhos, ou os houvesse tido, para conhecer a força do amor paternal' tenho certeza de que em parte me desculparia. Mas como não tem filhos, eu, que tenho um, não posso fugir à lei das outras mães, cuja força é superior à minha vontade e está acima de outros deveres e convenções, e assim venho, constrangida, pedir de você uma coisa que sei lhe é extremamente valiosa, porque nada mais lhe restou de consolo, ou diversão, no seu extremo infortúnio. Estou me referindo ao seu falcão, pelo qual meu filho criou tamanho apego que, a não ser que eu o leve para ele, receio que possa ter sua saúde tão agravada que eu o venha a perder. Portanto, eu lhe imploro, não pelo amor que me devota (amor que a nada o obriga), mas pela nobreza de sentimentos que sempre o distinguiu acima dos demais, que me deixe ter o falcão, para que eu possa proclamar que salvei a vida do meu filho e por isto lhe serei eternamente grata.

Federigo, ao ouvir o pedido da senhora, sentindo que não poderia atendê-la, porque lhe dera o falcão para comer, pôs-se a chorar antes mesmo de conseguir dizer qualquer palavra em resposta. No início, ela pensou que ele chorasse de tristeza por ter de se separar do seu querido falcão, mais do que por qualquer outra coisa; e estava quase para desistir do pedido, mas se conteve e esperou, depois do pranto, a resposta de Federigo. Que falou assim:

- Senhora, desde que Deus dispôs que eu dedicasse o meu amor à senhora, a Sorte me foi adversa em muitas empreitadas e muitas vezes me queixei do tratamento que ela me dispensou. Mas sua extrema dureza foi leve em comparação com o que tenho de suportar agora. Jamais viverei em paz, depois que a senhora veio me visitar em minha modesta morada, quando, em meus dias de fausto, nunca se dignou a visitar-me. Pediu-me um pequeno presente, que não estou em condições de lhe dar, por motivos que vou expor brevemente. Quando me vi contemplado com a grande recompensa da sua visita, levando em conta a sua dignidade e o seu valor, reputei adequado recebê-la, segundo minha capacidade, com algo mais nobre e precioso do que é geralmente dispensado às outras pessoas. Foi assim que, lembrando-me do falcão que a senhora veio me pedir, e da sua bondade, julguei-o um repasto à altura da senhora, que O teve servido assado no seu prato. Jamais poderia ter imaginado que talvez o desejasse servido de outra maneira e por isso me sinto tão infeliz de não poder atendê-la que jamais ficarei em paz comigo mesmo.

Dito isso, exibiu as penas, os pés e o bico do falcão como prova.

Ela começou a censurá-lo por matar um falcão daqueles para dar de comer a uma mulher; mas, no seu âmago, enaltecia a grandeza da sua alma, que a pobreza não conseguira sufocar. Depois, sem ter mais a esperança de levar o falcão, voltando a se preocupar com a saúde do filho, partiu com grande melancolia no coração e retomou ao seu filho. Este, decepcionado por não ter o falcão, ou por causa da doença que o acometera, morreu em poucos dias.

Ela mergulhou em prantos e amargura, ao mesmo tempo que ficou riquíssima e, como ainda era jovem, foi pressionada pelos irmãos para que se casasse de novo. Isso era contra suas inclinações, mas recordou o valor de Federigo e a última amostra de sua imensa generosidade, matando uma ave tão magnífica para agradá-la, e então falou aos irmãos:

-Preferiria continuar como estou. Mas, já que desejam que eu escolha um marido, decidi que só poderei me casar com Federigo degli Alberighi.

Sorriram com desdém e disseram:

-Deixe de ser tola! O que está dizendo? Ele não possui nada neste mundo. -Meus irmãos - replicou ela -, é verdade o que dizem. Mas prefiro um homem sem riqueza à riqueza sem um homem.

Os irmãos, ouvindo sua decisão, e conhecendo bem o caráter de Federigo, por mais pobre que fosse, concederam-lhe a irmã com toda a sua riqueza. E ele, vendo-se em posse de uma mulher que tanto amara, e cercado por tanta riqueza, soube cuidar melhor dos seus afazeres e terminou seus anos vivendo feliz para sempre com ela.

Simplizim, mas bunitim, não?

Kali.
Gostou, assine.



 

 

Não falo de mim,
mas do mundo,
bem mais importante
e interessante.
Quiçá, mais bonito :Þ

Creative Commons License

Blog Kálido, escrito por kali, é licenciado sob as seguintes condições:
Creative Commons:
Uso Não-Comercial-Vedada a Criação de Obras Derivadas
2.5 Brasil License
.

 



Clique
nos cartões abaixo
para ver os diálogos.

imagens:
Kim Anderson
textos: kali